O Colo Bom e o Colo Mau pt.II

Aqui em casa, só conseguimos ensinar o Afonso a dormir quando percebemos que não o podíamos adormecer ao colo. Primeiro achávamos que esta teoria era uma palermice. Que roçava a insensibilidade. Só depois entendemos que, afinal, se tratava de uma forma, como tantas outras, de educar o nosso filho.

Um coro de vozes dirá ser impossível encontrar registos de vitimas por overdose de colo ou de mama, constatação sustentada com toda a certeza por evidências científicas. Porém, o ideal para uma criança é habituar-se a adormecer pelos seus próprios meios e não com a ajuda de terceiros, sejam eles pais, mães, colos ou mamas. Tudo o que não remeta para lençóis, cobertores, almofadas, para o próprio bebé e para um peluche ou qualquer outro objecto de referência, está a mais na hora de dormir. Vale dar colo ao menino? Sim. Vale dar mama ao menino? Sim. Mas não no preciso momento de adormecer.

Por muito que queira lavar o meu carro, não vou atirá-lo para dentro de uma piscina cheia de detergente, julgando que, para além de sair dali a brilhar, o motor vai pegar à primeira. Bem sei que o meu amigo James Bond poderá não estar totalmente de acordo, porque em 1977, no filme 007 – Agente Irresistível, deram-lhe um bólide que se transformava em submarino e que sobreviveria a qualquer piscina. Trata-se, no entanto, da escepção que confirma a regra. Portanto, tudo o que é demais é moléstia, como já dizia a senhora minha madrinha nos seus tempos áureos. E esta regra também se aplica ao colo.

Se o nosso filho em idade pré-escolar chorar, berrar, rebolar pelo chão em pranto, pedindo um copo de vinho, ninguém no seu juízo perfeito lhe poderá satisfazer o pedido, mesmo que possua uma adega repleta de exemplares com as melhores colheitas de Bordéus. Da mesma forma, não se deve adormecer um bebé em balado ao colo, ou a mamar nos seios da mãe, só porque ele monta um escândalo lá em casa. Aliás, na minha opinião, não se deve anuir a qualquer exigência infantil feita com base no escândalo. Isso apenas funcionará como forte incentivo a que a gritaria se transforme num meio reivindicativo altamente eficaz.

in, O Meu Filho Não Dorme, Luís Maia, Editora Guerra e Paz, 2018

Publicado por

Luís Maia

Luís Maia nasceu a 15 de Outubro de 1976, na Póvoa de Varzim. Licenciou-se em Comunicação Social no Instituto Superior de Ciências Sociais e Políticas. Em 1999 trocou um emprego em part-time, num call center, por um estágio remunerado somente com senhas de refeição, na redação da TVI. Iniciou aí uma carreira de repórter que o levou a produtoras como a Duvideo, Teresa Guilherme Produções e Comunicassom, para além do jornal 24 Horas e de estações como a TVI e a SIC. Entre 2008 e 2009 viveu em Angola, onde coordenou o entretenimento do primeiro canal privado daquele país, a TV Zimbo. Actualmente trabalha para a FremantleMedia, fazendo reportagens em directo no segmento de actualidade criminal, do programa Queridas Manhãs da SIC. É baterista reformado, ex-futuro jogador de poker. Mas é, sobretudo, marido, pai e, segundo consta, bom chefe de família.

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